sexta-feira, 11 de julho de 2008

Segunda digressão

Bem, quase uma semana para escrever. Há uma explicação: como sempre, muito trabalho, pelo menos na segunda e na terça, puxadíssimo! Saímos os quatro intérpretes "esbodegados" devido às longas horas, mas com a sensação do dever cumprido e com um feriado pela frente (9 de julho, revolução onde sei que participaram de alguma forma dois de meus tios irmãos de papai, os paulistíssimos Tufi e José Sayeg. Não sei bem em que: acho que foi na intendência, mas mesmo assim orgulho-me da participação deles. Ativismo político pelo visto é mal de família...).
Então vamos voltar à cronologia:
em Monterey, onde devia passar três meses mas acabei ficando seis, para aperfeiçoar não somente o Inglês, mas também Francês e Espanhol, sofri bastante a princípio, pois não tinha nenhuma aula em Português, e para fins do estudo consideravam meu Inglês como sendo A, ou seja a língua materna, o que não era nem um pouco verdade. Mas aprendi muito. Tinha um monte de aulas, desde tradução escrita, a tradução à vista - tradução de textos na hora em voz alta, consecutiva, simultânea. Só pensávamos nisso. E tinha professores muito bons, que me deram excelentes ensinamentos sobre traduzir de uma língua latina ao Inglês, muito mais conciso e direto. Foi uma temporada muito boa. Além de tudo, arranjei um namorado americano, colega do curso, com uma combinação de línguas diferente da minha, pois ele falava alemão.
Daí que concluídos os seis meses e depois de um mês tentando arranjar um emprego nos vários organismos internacionais de Washington sem sucesso, voltei ao Brasil com a promessa de encontrá-lo na Bélgica em começo de 1982. Queríamos ambos tentar trabalhar para a Comunidade Econômica Européia, como se chamava na época.
Voltei ao Brasil e comecei a trabalhar com bastante sucesso. Comecei a tomar realmente gosto pela coisa e a ganhar dinheiro, o que também é bom.
No início de 1982 lá fui eu para Bruxelas. A temperatura estava a 14 graus abaixo de zero (o que é raríssimo por lá, diga-se de passagem) e não conhecíamos ninguém.
Fui conversar com uma pessoa encarregada da seleção e contratação dos freelance (outra pessoa que continua minha amiga até hoje, a escocesa Catriona White) e ela me disse sem rodeios que o Português na época não era prioritário. A Grécia tinha acabado de aderir - em 1981 - e provavelmente Espanha e Portugal iriam levar ainda alguns anos. Mas, de qualquer maneira,
como iria haver um teste em breve, que me chamariam para fazê-lo.
Fiquei meio aborrecida, mas achei que não custava tentar. E toca ouvir a BBC e tudo o que eu pudesse em Francês. Lembro-me de ouvir muito sobre a Guerra das Malvinas (ou das Falkland, pois eu as ouvia na BBC). E lembro-me também quando minha mãe me telefonou aos prantos, perguntando: "Sabe quem morreu?" Fiquei assustadíssima, mas também aliviadíssima quando ela disse que era a Elis Regina. Eu pensei que tivesse sido alguém da família...
Finalmente chega o grande dia. Fui tremendo feito vara verde, pois havia uma banca examinadora enorme. E lembro-me até hoje do texto da prova em Inglês, feito pelo então chefe da cabine inglesa, Tony Scott. Falava em rapé (snuff, em Inglês) e terminava por um trocadilho:
"Take snuff or snuff it", que queria dizer algo como "Tome rapé ou morra"... Por sorte, como eu leio quase tudo que me cai nas mãos, tinha lido sobre os "snuff movies", filmes em que há violência real... Enfim, depois de muito nervoso, fiquei felicíssima em saber que passara.
Só que eles me disseram que eu teria quando muito dois ou três dias de trabalho por mês. Ora, parecia muito pouco. E os dois lá sozinhos... Fiquei meio com medo e acabei voltando para o Brasil. Mas essa ida a Bruxelas teria consequências alguns anos mais tarde...

Um comentário:

Anônimo disse...

Prezada Tereza,

Parabéns pelo seu relato de cunho biográfico. Assim você torna mais visível a vida invisível do intérprete.

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Abraços,

Gilberto Dib